24 de março de 2009

CLINT EASTWOOD: O HERÓI QUER SOSSEGO

Um herói fúnebre. Assim pode ser interpretado o último papel de Clint Eastwood em seu mais recente filme. Ator, diretor e produtor, Eastwood une estas tarefas a todas as características marcantes de seus papéis antecessores, compondo um epitáfio inesquecível.

“Gran Torino” (2008) conta a história de Walt Kowalski, veterano de guerra, viúvo e pai de dois filhos, que passa seus dias observando seus vizinhos, concertando coisas e ilustrando seu carro Gran Torino, Ford, 1972. A adoração pelo seu carro é a única demonstração de afeto que se permite, já que não encontra nada que o aproxime de sua família. Kowalski, com toda sua arrogância e linguajar baixo, é na verdade o retrato do norte americano conservador que vive ainda o sonho do pré Guerra da Coréia, tempo em que o império azul e vermelho se expandia economicamente e emanava poder. Seu bairro na cidade de Detroit, que havia sido tradicionalmente estado-unidense, hoje é povoado por imigrantes e gângsteres, que montam um cenário atípico na percepção de Kowalski.

A história do filme se desenrola a partir da tentativa de roubo do vizinho adolescente hmong (grupo étnico do sudeste asiático) ao Gran Torino do americano. Kowalski acaba aproximando-se da família imigrante, ao ficar amigo da irmã mais velha do adolescente e se ver obrigado a empregar o jovem “ladrão”. De maneira rude e beirando o humor, o velho ao final de sua vida, se vê quebrando todos seus preconceitos raciais e afetivos, quando decide iniciar o menino à verdadeira vida de um homem. Eastwood foi feliz ao unir questões da igreja católica e de patriotismo, em uma diferente visão de mundo, que vai do insolente ao irônico.

Na técnica, o filme trabalha com o foco no rosto dos atores, mostrando as expressões faciais e contrastando os grunhidos do velho ranzinza com a jovialidade dos meninos hmong. Os trabalhos de campo e contracampo mostram também o cenário como fator importante para o significado das cenas. Entretanto, o abismo de interpretação entre Eastwood e os jovens atores é grande. Este é com certeza um jogo proposital de direção, pois aproxima a realidade ao contexto do roteiro, já que é o último filme de Eastwood e um dos primeiros dos jovens atores orientais.

A questão da propriedade na frase tão repetida “sai do meu jardim” brinca com o sonho americano e a invasão da globalização sem fronteiras. O filme revela um confronto urbano, violento e verdadeiro, que unifica as questões éticas e da essência da vida. Kowalski encontra em dois jovens imigrantes toda a compaixão que nunca exerceu, redimindo a si mesmo pecados que sempre carregou. Eastwood sintetiza neste filme todos seus papéis já atuados no cinema e finaliza com uma mensagem clara: o herói está desarmado e quer sossego.
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Gran Torino (2008), 116 min.
Direção: Clint Eastwood
Roteiro: Nick Schenk, Dave Johannson
Com: Clint Eastwood, Christopher Carley, Bee Vang, Ahney Her, Brian Haley, Geraldine Hughes, Dreama Walker

Assisti final de semana passado e recomendo!

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